| o teu caminho é teu


depois de confirmar o diagnóstico com mais três reumatologistas e depois de muita investigação, fui ter com um querido amigo (médico medicina ocidental e medicina tradicional chinesa). conversámos muito. também ele confirmou o diagnóstico e eu, em confidência, desabafei a minha decisão. não iria ter filhos. 

não tomei esta decisão de ânimo leve. desde criança que sonhava em ser mãe. lembro-me bem do dia em que eu soube que iria ter uma irmãzinha, tinha eu, 9 anos: entrei no quarto dos meus pais e vi a minha mãe a chorar, de sorriso nos lábios. o meu pai olha para mim, com cara de "futuro pai babado pela segunda vez" e diz: "vais ter um mano ou uma mana...". eu corri para o quintal e chorei. estava tão contente... foi, sem dúvida alguma, o dia mais feliz da minha vida.

desde então, eu e a minha tia mais nova (que vivia connosco e que era uma espécie de irmã mais velha, para mim), líamos tudo o que encontrávamos sobre gravidez, bebés... como se faziam os bebés, como o bebé se formava na barriga da mãe, como ele nascia...

ao longo da minha adolescência fui planeando a minha gravidez. quando chegou a altura certa, comecei a planear o parto (eu gosto muito de planos...). iria ter o meu tiago ou a minha matilde , em casa, com a ajuda de uma dola.

mas, um pouco antes de engravidar, fiquei doente.

quando fui, finalmente, diagnosticada, foi o choque de saber que a doença tinha uma forte componente hereditária. além disso, eu estava muito afectada, tanto física como psicologicamente. eu não conseguia me movimentar, sem ajuda. era a minha mãe que tratava da minha higiene pessoal e, tinha dias, em que até comer à boca, me dava. como poderia eu ter um filho, assim?

o meu amigo médico foi o primeiro a saber e conhecendo o meu sonho de ser mãe, abraçou-me, sussurrando que era a decisão mais acertada. para nós estava claro que existia uma grande probabilidade do bebé nascer com a doença. o "meu filho ou filha... ter as mesmas dores que eu tenho? como iria conseguir lidar com a dor do meu bebé? com a minha dor, eu consigo lidar. uns dias, melhor, outros dias, pior, é certo... mas é a minha dor! mas a dor do meu bebé?... e quem trataria do bebé? a minha mãe?" para mim, ter um filho é estar presente a cem por cento, na sua vida. dar colo, dar mimo, brincar, ajudar a crescer, a ser... e, além disso, estava fora de questão, sobrecarregar a minha mãe, com mais uma criança.

quando tornei pública, a minha decisão, as minhas pessoas compreenderam e aceitaram. e mimaram-me. outras pessoas, porém, acusaram-me de ser egoísta e pressionavam-me, no sentido de me demoverem, da minha decisão. como se não me sentisse o mais miserável, possível, ainda tinha quem me atirasse mais lama para cima...

foi o luto mais profundo que eu carreguei comigo, por tantos anos. foi extremamente difícil para mim. chorei muito... muito, mesmo. porque eu já os sentia (aos meus filhos), como se estivessem comigo, há muito...

não podia ver uma criança a brincar, uma mulher grávida, uma ecografia... começava a chorar. porque doía. tanto que não sei explicar.

quando a minha vida mudou, graças à dieta sem amido, decidi voltar ao trabalho. não voltei a exercer a minha profissão. preferi trabalhar com a minha mãe, que era ama.

os primeiros meses foram uma autêntica tortura. no mesmo mês em que eu comecei a trabalhar, entraram dois bebés de 3 e 4 meses. tão pequeninos, tão frágeis... tão lindos...

a menina chamava-se clara. linda, a minha princesinha...

muitas vezes, eu pegava nela e ali ficava. não conseguia evitar, as lágrimas escorriam-me pela face. poderia ser a minha matilde... pensava, para mim.

a minha mãe apercebendo-se que eu não estava a lidar muito bem com a situação, vinha para ao pé de mim, pegava na clarinha e conversava comigo. ela sempre me apoiou, na minha decisão... disse-me que seria a sua decisão, também.

aos poucos, a mágoa e a dor foram passando. não vou dizer que já não dói. mas, como com tudo na vida, aprendi a aceitar.

perguntaram-me, tendo a ea entrado em remissão, se não pondero tentar ter o meu tiago ou a minha matilde. o desejo, confesso, ainda está lá, no meu coração... mas, embrulhadinho numa manta cor-de-rosa, quentinha. serei mãe, talvez, um dia... mas não agora, não nesta vida. e está tudo bem.

[gostaria de salientar que esta publicação é, somente, o meu testemunho. conheço muitas pessoas com ea que tiveram filhos e conseguiram ser mães e pais, a tempo inteiro. e, a maioria das crianças são saudáveis, sem ea. contudo, também conheço muitas mulheres e homens que decidiram não ter filhos e se sentem tristes, por isso. porque dói. porque é uma decisão difícil para nós e há, ainda, quem nos faça sentir as piores pessoas, por termos decidido, assim. esta publicação é para essas mulheres e para esses homens. é para nós. porque somos nós, que trilhamos o nosso caminho. porque somos nós que temos de decidir o que, em consciência, é o melhor para todos...]

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